Festas Profano-Religiosas

AS JANEIRAS
( Recolha efectuada na freguesia de S. Bartolomeu de Messines pela Luísa Conduto, Paula Vasconcelos e Rui Cuiça )

Sr. Mateus da Silva Sequeira, 87 anos, viúvo.

“ No meu tempo, juntávamos três camaradas e íamos, de porta em porta, cantar estes versos das Janeiras:

Esta noite é de Janeiras
é de grande merecimento
por ser a noite primeira
é a que Deus passou tormento.

Tormento que Deus passou
foi p’ra nossa salvação
foi p’ra salvar o mundo
e também os que cá não estão.

...Era uma coisa assim, mas já não me lembro muito bem.

- Quando é que costumavam cantar as Janeiras?
Era no Natal, no Ano Novo ou nos Reis?

No Natal, não! Pois, era na altura do Ano Novo. Pelos Reis, acho que também cantavam, mas era outra coisa... Já não me lembro.
Nas Janeiras, as pessoas juntavam-se e iam cantar de porta em porta, acompanhadas sempre por um tocador de harmónio.
Os donos das casa davam sempre qualquer coisa aos cantadores e aos músicos. Geralmente, quando se tratava de rapaziada nova, davam um chouriço, mas quando era gente mais velha, davam uma tigela de milho para as papas, porque, naquele tempo, era muita a miséria.
Muitas vezes, os grupos eram formados por famílias inteiras ( filhos e mães ) muito necessitados. Nesse dia, coitados, perdiam a vergonha e iam cantar, para lhes darem alguma comida. Muitas dessas famílias mais pobres viam-se obrigadas a cantar as Janeiras por necessidade.
No entanto, as Janeiras constituíam uma tradição que já vinha de muitos anos atrás.”


Sr. José dos Santos Cabrita

“No meu tempo de rapaz, as Janeiras eram as cantigas “cantadas” por um grupo de rapazes e raparigas, nas noites de 31 de Dezembro e 6 de Janeiro, vésperas de Reis. Fazíamos isso todos os anos...
... Os grupos que a gente formava eram acompanhados por um tocador de acordeão, para alegrar mais a festa, e, assim andávamos pelas Ruas da Vila, batendo de porta em porta, cantando as Janeiras, ou seja, fazendo versos aos próprios moradores.
Vou contar-vos, dos muitos que a gente tinha na altura, alguns versinhos que me vêm assim à cabeça:

“Um raminho, dois raminhos,
três raminhos de algodão,
viva a Srª Dª Ana,
mais o Sr. João.”

Depois, consoante as casa onde íamos, mudávamos os nomes aos versos, ou seja, os nomes das pessoas das casas.
Para nós, as Janeiras eram um divertimento.
Mas, antigamente, as necessidades eram muitas, e, alguns grupos iam cantar as Janeiras para acarear algumas coisas para comer, coisas que os próprios donos das casa davam, e, que, geralmente, eram chouriços, filhós, laranjas, milho, enfim, o que houvesse em maior fartura.”

- Nesse tempo as pessoas não costumavam dar dinheiro?

“Pois o dinheiro nessa altura era pouco. Havia quem pudesse dar; havia algumas pessoas que tinham possibilidades e davam, mas isso não acontecia sempre.”

- Considera o cantar das Janeiras uma tradição?

“Sim. As Janeiras sempre foram uma tradição de há muitos anos, que ia passando, na mesma família, de pais para filhos. Eu já as ouvia cantar ao meu pai e ao meu avô, porque esta tradição vinha passando de geração em geração.
Com o passar do tempo, infelizmente, acabou-se, porque se foi perdendo o hábito. A gente nova tem outros gostos e, praticamente, hoje ninguém canta as Janeiras.
Se calhar alguns dos mais novos nem sequer ouviram falar das Janeiras. Outros podem ainda ter cantado com os pais e os irmãos, mas até para estes, actualmente, as Janeiras não passam de recordações.”

- Então, hoje, o Sr. já não vê ninguém cantar as Janeiras em S. B. de Messines?

“Vejo, mas muito raramente, e os que vejo fazem parte do Rancho Folclórico de S. Bartolomeu de Messines que se juntam acompanhados do seu acordeonista e restantes instrumentos.”