Festas Religiosas

A PÁSCOA
( Recolha efectuada na freguesia de S. Bartolomeu de Messines pela Luísa Conduto, Paula Vasconcelos e Rui Cuiça )

Sr. Mateus da Silva Sequeira, 87 anos, viúvo

“A Páscoa era uma festa mais familiar e também mais séria, mas nós também cantávamos e divertíamo-nos.
A Páscoa resumia-se a isto: cada um comia e bebia, em sua casa com a família, e estava satisfeito da vida, porque naquele tempo, os casais eram sempre bem vividos. Eles não se zangavam com as mulheres. Muitas vezes, pelo contrário, eram elas que se zangavam com eles, porque bebiam muito.
Era assim que nós vivíamos a Páscoa.”

- Então, e nesse tempo faziam contratos?
“Faziam. Ora, as pessoas com quem se faziam os contratos passavam a chamar-se “padrinhos” e quando se encontravam na rua, voltavam-se uns para os outros e diziam:
-Olha, ali vai o padrinho!
Os contratos também eram feitos entre rapazes e raparigas, mas elas, às vezes, quando nos viam, escondiam-se.
No dia de aleluia, quando nos encontrávamos, o primeiro que dissesse “padrinho”, ganhava o folar ou as amêndoas.”

Srª Dª Evengelina Miguel de Sousa, 66 anos, viúva

“Nos meus tempos de garota, quando havia bailes, estes terminavam logo depois da meia noite de terça feira de Carnaval, porque, no dia seguinte, era quarta feira de cinzas.
Aliás, os meus pais diziam-nos logo:
Podem dançar até à meia noite porque depois já não se dança”.
Na quarta feira de cinzas jejuávamos sempre e, durante a quaresma, havia mais dias em que também se jejuava. Eram as sextas feiras, o dia de S. José e o dia da Encarnação. Nesses dias comíamos, apenas, pão e água. A minha mãe fazia sempre isto, na véspera e no próprio dia.
Também fazíamos uma reza que era assim – rezávamos 50 Avé-Marias e, por cada uma delas, benzíamo-nos e persignávamo-nos.
Naquela altura, também havia o hábito dos Contratos. Especialmente a gente nova gostava de fazer contratos, para depois receber as amêndoas no dia de Páscoa.
Nas vésperas da aleluia, andávamos sempre a ver quem é que perdia as amêndoas. Por isso, escondíamo-nos para provocar os encontros, porque aquele que primeiro avistasse e que primeiro pedisse, era o que ganhava as amêndoas.
No dia da Procissão de Ramos, que era a procissão feita com as palmas bentas, tiravam-se umas palmas que se cruzavam. Juntavam-se, então, quatro rapazes ou raparigas e cada um puxava para seu lado.
Aqueles que tivessem agarrado as duas pontas da mesma palma, ficavam compadres. O mesmo se passava com o outro par. Era assim este hábito engraçado e que, no entanto, não deixava de atrair o convívio e a confraternização entre os Cristãos, o que hoje já não se vê.
Antigamente as Aleluias eram sempre ao meio dia.
Além disso, também havia o banho, ou seja, as pessoas gostavam de tomar banho e, naquele tempo, como não havia piscinas, mas ribeiras e tanques ( ou nalguns casos a praia ) as pessoas tomavam sempre um banho, ao meio dia, no sábado de Aleluia.
Embora já um pouco longe, são estas as coisas de que me lembro...

- A Senhora lembra-se da cerimónia do Lava-Pés?
“Sim. Também era uma cerimónia a que gostávamos muito de assistir, em silêncio, e com muito respeito. Para este ritual do Lava-Pés, geralmente, eram sempre escolhidos doze pobres da freguesia. Eram convidados com bastante antecedência e eles, coitadinhos, ficavam todos contentes. Mesmo aqueles que nunca se lavavam, naquele dia, apareciam todos arranjadinhos. Depois, o Sr. Prior lavava-lhes os pés, beijava-os e dava-lhes um pacotinho de amêndoas, o que os deixava todos contentes. Parece-me, mas não me lembro muito bem, que também lhes dava uma pequena flor. Parece-me que era assim.
Sim. O Sr. Prior dava-lhes uma florzinha que eles colocavam na lapela e um saquinho de amêndoas”.

- E quanto às procissões?
“Sabem. Nós aqui nunca podíamos fazer a procissão do Encontro, como geralmente se faz noutros lugares, porque não tínhamos a imagem de Nosso Senhor dos Passos, mas fazíamos as outras.
Logo na quarta feira de cinzas começávamos com as cerimónias da Semana Santa, e a primeira era constituída pelas "trevas".
A Igreja vestia-se de luto e todas as capelas eram cobertas com panos pretos. Havia várias cerimónias durante todas as noites, e, na Igreja, ainda lá está um círio com muitas velas dos lados que se iam apagando durante as cerimónias, e, às quais nós gostávamos de assistir do princípio ao fim.
Na sexta feira santa havia a procissão da Nossa Senhora, do Sr. João e do Senhor no tumbinho ( túmulo ). Nesse dia, todas as pessoas dos arredores vinham a São Bartolomeu de Messines preparadas para ficar durante o dia e para a noite assistir à procissão. Abalávamos de manhã para estarmos presentes nas cerimónias e nas procissões que duravam muito tempo, porque eram muito grandes e todos procuravam tomar parte.
Também nos reuníamos ao domingo. Por exemplo. Eu era do campo, um bocadinho distante - aí uns 7 Kms da Vila – mas vinha todos os domingos. Saía de casa de manhã e já sabia que era para estar aqui o dia inteiro. Assistíamos à missa e tínhamos os convívios ou reuniões da “fé católica”. Gostávamos muito desses convívios porque acabávamos por reunir aqui as raparigas novas de todas as aldeias vizinhas: Cumeada, Portela, Barrocal, Benaciate, etc.
Durante a quaresma, as procissões eram feitas à noite.
Actualmente, durante o período da Páscoa, só se faz a procissão do Domingo de Páscoa, à qual ocorre sempre muita gente, mesmo gente do campo, e, eu, pessoalmente, gosto muito desta procissão. Todas as outras que eram feitas nesta época do ano, desapareceram.
Antigamente, até se fazia uma procissão à Ermida de S. Pedro, no Sítio do Furadouro, onde se levava a imagem de Nossa Senhora. Era uma procissão em que toda a gente tomava parte.
Pois, quanto à Páscoa, não tenho assim mais nada a dizer, a não ser que a procissão do domingo de Páscoa nunca foi esquecida. Se calhar hoje ainda ocorre mais gente do que antigamente, e isso, talvez, se deva ao facto de ser uma das únicas que se faz durante o ano.”